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segunda-feira, dezembro 14

o estranho dom de voar.

Podia ter se adaptado, mas preferiu ser como queria. Depois de tudo o quê havia passado, podia se dar a esse luxo. Ao ouvir o mínimo murmúrio do vento, se escondia. Através daqueles corredores o ar se tornara gélido, insuportável para ele. Não sabia explicar o porquê de tanto medo, mas sabia que havia algo de estranho entre ele e o vento. Mas um dia, numa noite clara e quente, furtivamente resolveu fugir, tentar escapar daquela prisão mesmo ainda não sabendo ao certo se a prisão era sua mente ou aquelas paredes. Correu sem parar, à luz da lua cheia, ainda um pouco receoso pois, sabia que a qualquer momento o vento poderia surpreendê-lo. Então começou a perceber o quê perdia por estar preso, viu inúmeras cenas ao ar livre passarem por sua cabeça e ao mesmo tempo sentiu ódio por privarem-no daquilo. Foi então que, de súbito, decidiu enfrentar seu maior pesadelo, exorcizar seus medos. Subiu até a montanha mais alta disposto a encarar o vento, e admitir que não tinha mais medo dele. E com um abismo à sua frente, o mar batia contra às pedras lá embaixo, ele encarou o horizonte e gritou:

- Não tenho mais medo de você!!

Foi aí então que o vento bateu como uma onda, arremessando-o para o ar. Ele subiu sem parar, rodopiando e ao mesmo tempo são de tudo o quê se passava. A terra se distanciava cada vez mais rápido de seus pés, e ele pôde perceber suas enormes asas brancas que o levavam para longe dali. Ainda não conseguia controlá-las, parecia que tinham vida própria. Elas o levaram para uma altitude quase sufocante, rarefeita, e o ar frio fazia o medo aumentar mais ainda. Então as asas o fizeram planar e ele, aterrorizado, começou a perceber que elas não lhe queriam mal. O faziam sobrevoar toda a costa por onde sempre se imaginou correndo, o mar era mais belo àquela hora, e a lua estava tão grandiosa no céu que parecia olhar para ele. Foi então que começou a se acostumar e até tentou aproveitar o vôo, mas nesse momento sentiu que tomava o controle das asas. Aí todo o medo ficou pra trás, toda a angústia que lhe afligia a alma fora esquecida. Se sentia pleno, nato, vivo. Todo aquele constrangimento da vida se tornara plena satisfação. Esse era o ingrediente que faltava pois agora tinha certeza que estava em seu habitat natural, percebera o seu lugar.

Vôou de volta até onde havia sido aprisionado, para destruir as correntes que aprisionaram tantos outros, por tanto tempo. Fez com que todas as correntes e grades fossem abertas só com a força de suas asas. Mas havia sido pêgo de surpresa quando sentiu seu sangue escorrendo por onde uma faca havia lhe penetrado a carne. Tal faca era de homens sem face que o aprisionaram. Tentaram detê-lo inutilmente, mas ele ainda se manteve de pé e libertou a todos. Pois o novo amor pela vida era o suficiente para ele e para todos que o acompanhassem.

Às vezes ainda se vê um estranho ponto no céu, um ser humano que recebeu o dom de voar.

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